terça-feira, 19 de maio de 2020

Encapsulados

Quanto da busca realizada durante a navegação em aplicativos, sites de relacionamento etc feita em um dia fica retido?

Quanto tempo consegue ficar sem "novidades"?

Quanto tempo é capaz de dispor para ler um texto, às vezes, de pouco mais de um parágrafo ou assistir a um vídeo que dure mais do que dois, três minutos?

Quanto tempo consegue ficar longe do seu celular?

As respostas à essas perguntas podem levar a um dado de realidade bastante preocupante: não só o esquecimento de boa parte desse conteúdo é certo; assim como o são a irritabilidade, a impaciência diante de conteúdos mais extensos ou da necessidade de fazer alguma reflexão.

Impaciência observada,também,  com as pessoas - que têm seu próprio tempo para desenvolver um raciocínio, sua cadência de fala etc..  

A imagem de pessoas encapsuladas caminhando lado a lado numa ilustração, fez com que pensasse na dificuldade de relacionamento dada, também, pela pouca disponibilidade de escuta do outro, pela intolerância  para com as diferenças de opinião, visão de mundo, entre outras.

A pressa para voltar à sua capsula, onde as coisas acontecem ao próprio ritmo, ao próprio gosto parecem caracterizar as relações no mundo contemporâneo - antes e durante a pandemia. Ainda mais evidenciada,no caso da pandemia, fragilizando os vínculos que dariam sustentação para esse momento tão delicado que atravessamos. 

Que o outro não seja visto só como um vetor de contaminação, motivo de irritação ao solicitar que saia por algum tempo de sua cápsula - seja ela qual for! Que, ao contrário, seja aquele que espelhe sua própria necessidade de ser acolhido, ouvido e compreendido.

quarta-feira, 13 de maio de 2020

Lutar Re-lutar ou Relutar

Luto.
Luto, para não deixar ir,
mas, aos poucos, peço à dor da perda
levar daqui o que não queria perder. 





Luto, reluto.
Luto, com as lembranças,
com a tristeza que a elas se mistura.



Luto triste.

Luto, com o cinza que fechou o tempo dos meus dias,
trazendo, de repente, as saudades
que tão cedo não queria sentir.



Lutamos e relutamos para não deixar ir a rotina conhecida, os afazeres que davam sentido às nossas vidas até bem pouco tempo.
Impedidos de continuar levando a termo o dia a dia, como sempre o fizemos, como em qualquer situação de perda, passamos por estados que vão da negação da perda à resiliência. Da luta em vão com a realidade à atitude de aprendiz de um novo desconhecido.

Naturalmente, estamos tristes, com medo, irritados. Lutamos com as lembranças de todo um modo de estar no mundo. Lutamos com a insegurança, com a escassez, com a falta de perspectiva  - própria dos  momentos em que sofremos perdas.

Lutamos e relutamos. Muitos uns com os outros, no privado e no público. Não aceitando deixar ir. Relutamos em aceitar as novas regras, a nova maneira de estar na realidade que se apresenta dia a dia.

Mesmo tristes, indignados podemos lutar de maneira diferente da habitual como alguns lutam ao olhar para os mais necessitados, buscando soluções imediatas para sua sobrevivência. Tantos outros, aproximam-se para melhor viver as escolhas feitas, quando para elas não encontravam tempo. Outros poucos puderam desenvolver habilidades e/ou usufruir mais de seus interesses ou descobrir novos. Enfim, muitos atuam, enfrentam, criam alternativas para passar por essa turbulência inesperada.

Os relacionamentos tanto puderam se beneficiar como tornaram-se os maiores obstáculos a serem vencidos - como costuma acontecer, diante das perdas. Aqueles que se beneficiam são os que estreitam, ainda mais, seu laços. Outros estão se dando conta da fragilidade dos vínculos que suportam a convivência maior e o enfrentamento das dificuldades comuns.

E, ainda, há aqueles que resistem bravamente à qualquer mudança. Entendem como desnecessários os cuidados, as atitudes preventivas diante dessa pandemia que nos assola e faz desaparecer tão dolorosamente tantas pessoas.

Lutar e re-lutar é preciso. Todos os dias. Dia após dia.
Exercitar a paciência para que ganhe robustez nesses tempos em que, mais do que nunca, ser resistente à frustração é ter potência para vencer obstáculos, de forma simples, de maneira criativa e constante.