domingo, 21 de agosto de 2011

Esconder-se ou Exibir-se ?

" Todos os sentimentos de suspeita ou hostilidade inatos, de precauções vagas e desejos de ocultar algo, desde que afetem o indivíduo nas suas relações sociais, revelam, de um modo geral, a mesma tendência de fuga à realidade, que impede a auto-afirmação... A coragem social depende desse sentimento de participação segura da família humana, sentimento do qual depende a harmonia da nossa própria vida"... (A. Adler)

Em contrapartida ao sentimento de inferioridade, que leva o indivíduo a restringir sua vida a espaços cada vez menores e mais pobres tanto de criatividade como de relacionamentos, existe outro sentimento tão importante quanto - a vaidade.
Flávio Gikovate diz que " a vaidade é a matriz de vários dos nossos impulsos difíceis de serem avaliados do ponto de vista moral, como é o caso da ambição, do desejo de chamar a atenção das pessoas e de se destacar. É ingrediente essencial da sede de vingança que sentimos quando somos humilhados, assim como da inveja e mesmo do ciume".

Sentimento de Inferioridade e Vaidade - dois sentimentos que levam à distorções na maneira de perceber a si, aos outros, a vida e a maneira como cada um se coloca nela. Ambos provocam raiva, inveja e ciúme, apesar de dinâmicas diferentes.

No sentimento de inferioridade tememos o olhar do outro, receamos seu julgamento porque nele projetamos a autoimagem distorcida que construímos ao longo da vida.
O outro aqui é ameaça que precisa ser afastada, assim como as possibilidades de conquistas e realizações; afinal,quem se sente inferior julga-se incompetente para tanto! A pessoa que nutre esse sentimento preserva sua vida das ameaças que a avaliação irreal de si mesma a leva a fazer das relações sociais e das suas possibilidades de realização pessoal.

A vaidade, por outro lado, leva a pessoa a exibir quaisquer feitos seus para que o outro a aprecie e a admire... Segundo Gikovate (estudioso da vaidade desde os anos 80), a vaidade faz parte do instinto sexual e, por isso mesmo, inerente à nossa espécie. Corresponde a um prazer erótico difuso que se manifesta quando provocamos a admiração ou o desejo sexual. Ainda segundo ele, trata-se de um estado de excitação sexual desencadeado pelo olhar das pessoas que nos cercam; porém, não está particularmente relacionado com elas. Trata-se de excitação e não de desejo, ou seja, não provoca anseios de aproximação ou de contato físico. ("Nós, os humanos",pg.54)

Portanto, ao contrário do sentimento de inferioridade, na vaidade, busca-se o olhar dos outros para satisfação pessoal e sensação de poder. 
Nessa sociedade pós moderna em que vivemos ter visibilidade, sucesso, reconhecimento é valor que pode obcecar:  Espelho, espelho meu, existe alguém mais bonito, mais bem sucedido, mais poderoso do que eu?

Sempre há! E a luta para superar esses "rivais" conduz ao distanciamento cada vez maior de si.
Escondendo-se ou se exibindo, deixa-se de consolidar,de fortalecer a própria identidade.

A distorção da autoimagem provocada tanto pela vaidade, como pelo sentimento de inferioridade interfere nas relações amorosas, provocando desconfianças e, consequentemente, sofrimento. Em ambos os casos, as qualidades intrínsecas à pessoa que se relaciona dependem do reflexo que o olhar do outro pode proporcionar: Espelho, espelho meu ...Ameaça ou admiração? Inferioridade ou vaidade?
Fugir dos espelhos ou alienar-se neles?
E, quando não estiverem disponíveis? Sou? Existo?


Parte da imagem que ao longo da vida formamos a nosso respeito, depende do reflexo desse outro. 
O bebe sente que é amado ao ser ser refletido pelo olhar de prazer da mãe ao tê-lo em seus braços. A criança pequena em ser admirada por suas "gracinhas", pelos adultos que a cercam. A maior, pela sua maneira única de ser e por seus conseguimentos; e, assim por diante. Família, amigos, pessoas que são significativas e admiradas por cada um de nós têm peso no desenvolvimento desse sentimento tão importante - a autoestima ,como também, na formação da autoimagem.

No adulto, autoimagem bem constituída e autoestima saudável, contribuem para que o valor pessoal não dependa do reflexo da própria imagem nos olhos de outrem: nem para ver neles sinais do quanto se é único, especial.Nem para que deles se fuja a fim de não ver refletida a imagem que não se quer ter de si mesmo.
Nunca é demais lembrar que elas - autoestima e autoimagem- desempenham papel importante na maneira como a pessoa se coloca no mundo, assim como, no sentimento de pertencer à família humana.

Tornar-se independente desses reflexos, tendo mais consciência de si, experimentando o prazer da própria companhia e, principalmente, valorizando quem se é são algumas das maneiras de superar tanto o isolamento social como a necessidade de se exibir como personalidade rara, com qualidades diferenciadas, como se acreditava a madrasta do conto de fadas "A Branca de Neve"... Espelho, espelho meu, existe alguém mais...do que eu?